sexta-feira

23

fevereiro 2024

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Batalhas e amizade num Coliseu de rimas online

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A batalha (da esquerda pra direita): MCs Grafiteh e Magrão versus Meny BXD e Vini

O rap está on. Se você não conhece os maiores nomes das batalhas e rodas de MCs, está bem por fora do que está acontecendo no hip hop. Vários rappers chegam a quase 1 milhão de seguidores no Instagram e os encontros semanais, no Rio, São Paulo, Minas e outros estados, são assistidos por centenas de milhares de fãs online. No mundo digital do rap (como em quase todos outros meios), número de seguidores é moeda corrente.

A Batalha do Coliseu, criada em 2019, é uma das principais. Quem passa apressado de carro pela Praça da Bandeira numa terça à noite, talvez não se dê conta do porquê este ponto de referência na Tijuca, ficar lotado. O motivo não é um esquenta para algum jogo no Maraca, nem alguma edição do tradicional alagamento provocado por chuvas no verão. O que reúne centenas de jovens de diversas regiões da cidade na praça é o rap.

Como é bom ver a cena verdadeiramente independente respirar no Rio. Se não fosse levado pelo meu filho, impactado pelas batalhas através do YouTube, também não saberia que nada disso estava acontecendo (provavelmente estaria assistindo o Mengão aplicar 4×0 no Boa Vista a poucos metros dali).

Com 555k assinantes no YouTube e 234k no Instagram, assim como acontece com outros eventos do gênero, a Batalha do Coliseu tem maior visibilidade online do que ao vivo. É através das lives, também transmitidas na Twitch, que as disputas chegam às telas de milhares de fãs pelo país. Num dia que prometia muita chuva, o evento na Praça da Bandeira reuniu duas centenas de fãs, enquanto mais de 70 mil pessoas acompanhavam de casa através de uma live no YouTube.

Muita coisa mudou desde que o MC Aori fundou a seminal Batalha do Real no já longínquo 2003, na Lapa. Talvez, grande parte da molecada presente na Praça da Bandeira nem conheça o evento ou saiba que nomes hoje muito conhecidos como Emicida, Filipe Ret, Criolo, Xamã, começaram a despontar na BdR.

Hoje presença online é um fator decisivo e as batalhas não são mais apenas um ritual de passagem e sim uma cena em si, com suas próprias estrelas, fãs e tradições. Aos poucos, os MCs de batalha vão conquistando espaço sem precisar migrar para o rap, gravar um disco e todo resto do caminho tradicional. Vivem online e ao vivo.

No tablado montado sob uma lona, apenas um toca-discos soltando bases em loop para disputas ferozes no microfone. As rimas são repletas de ofensas pessoais, para alegria dos adolescentes e para um olhar desacostumado com a energia do evento, parece que em algum momento o caldo vai entornar. É puro teatro e logo na sequência os MCs estão abraçados e conversando após os embates. Essa brodagem é o traço que une artistas e público ali.

O ringue não é por caso e coisa toda lembra um esporte e está se profissionalizando. Os MCs atendem os fãs com atenção, cuidam de suas redes e, desceu do palco, estão todos trocando ideias. A geração anterior construiu as bases, mas não teve esse alcance viral trazido pelo TikTok (onde nem levantei os números de cada MC) e outras plataformas. Essa profissionalização transforma também o conteúdo.

Antes do evento começar, MCs locais como Neo BXD (588k seguidores no Instagram), Devilzinha (101k) Fael (376k) e Thorment (11k), circulam pelo local, assim como MCs de outros estados, como Lya (1,4m), Aline (266k), Brennuz (853k) de São Paulo, BMO (967k) de Brasília, Tonhão do Ceará (34k) e Sofia (136k) de Santa Catarina. Muitas crianças comparecem, tiram fotos com os ídolos, que pacientemente atendem os pequenos fãs.

Nesta última terça as disputas foram entre duplas, em dois rounds, com um terceiro de desempate, é a reação do público que decide o vencedor. Uma dupla de MCs falou e isso abriu vaga para inscrição de dois novos nomes, direto da plateia para o palco. Nada mais alinhado com a geração online, onde cada um pode ganhar fama, do que isso.

Os MCs Meny BXD (313 seguidores) e Vini (272 seguidores) tiveram a audácia de se inscrever, talvez sem esperar que de fato fossem ser sorteados. Pois foram e do outro lado estavam dois pesos pesados de São Paulo, consagrados nas batalhas: Magrão (921k seguidores) e Grafiteh (97k seguidores), aguardavam os novatos.

E como naquele filme do Eminem, os garotos começaram nervosos, travaram, escorregaram no flow, perderam o tempo e foram amassados pela experiência dos dois MCs cascudos. Uma galera riu, outra apoiou a presença de dois representantes da plateia no palco.

Logo na sua primeira entrada, Meny se atrapalhou pra rimar algo e se declarar fã de Magrão, talvez esperando alguma compaixão. Não teve. Magrão e Grafiteh rasgaram os moleques sem dó. Não importava. Os desafiantes até tiveram bons momentos, arrancaram alguns gritos da plateia, mas mesmo com o massacre previsível, os olhos dos dois meninos brilhavam, só de estar ali.

Meny e Vini se abraçavam, abraçavam os ídolos, sorriam, se cumprimentavam. Eles não estavam nem aí pra impossibilidade de ganhar, só estavam felizes pela chance de dividir o palco com os brabos. No intervalo entre o primeiro e segundo round, a beleza do evento se mostrou. As caras amarradas e marrentas deram lugar ao companheirismo. Magrão e Grafiteh incentivam os meninos, “relaxa”, “aproveita o momento”, “tamo junto”. 

Eles entenderam o jogo, sabem que pra essa cena perdurar, precisa ser aberta. É a renovação que garante a continuidade. Mesmo que segundo depois, os personagens voltassem a tona pra detonar os iniciantes e mostrar quem é que (ainda) manda.

O rap está na rua e está no melhor lugar: em casa.

terça-feira

9

maio 2023

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URBe, 20 anos!

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E assim, sem nem me dar conta no próprio 29 de abril, o URBe completou 20 anos.

Que viagem!

domingo

29

agosto 2021

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DEP: Lee “Scratch” Perry (1936-2021)

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Lee “Scratch”Perry, 1936-2021.

Revolucionário, inovador, criativo, transgressoe, Lee “Scratch” Perry foi um dos maiores entre os maiores. Os ecos do seu impacto e influência serão ouvidos por anos e anos e anooooo… oooooo… sssssss… 🔊

Foi uma honra ter podido te ver de perto. Obrigado pela generosidade e pelas músicas! Seu som viverá pra sempre! Dubwise, mestre! ❤️💚💛 🇯🇲

quarta-feira

14

abril 2021

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MIT Tech Review (abril 2021)

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Artigo sobre o futuro da internet que escrevi pra MIT Tech Review Brasil.

O futuro será cada vez mais digitalizado. Isso não é uma premissa, é simplesmente a realidade. De muitas formas, esse futuro já chegou. Transformações tecnológicas são uma constante e a descentralização da internet por meio da criptografia é a próxima grande revolução digital. Há 15 anos, quando se falava que estaríamos hiperconectados, enviando vídeos de qualquer lugar do mundo e que o celular substituiria os computadores pessoais, muita gente duvidava. O processo de descentralização da internet já está em curso.

Acreditar ou não no impacto dessas transformações está diretamente ligado a resposta a uma pergunta bem simples: o mundo vai se tornar mais ou menos digital nos próximos anos? A resposta parece óbvia.

Siga lendo no site da MIT Tech Review.

Muito além do NFT: metaversos, Web3 e o futuro digital

A explosão do mercado da cripto arte é apenas a ponta visível de uma completa transformação da internet através da criptografia e da descentralização.

O futuro será cada vez mais digitalizado. Isso não é uma premissa, é simplesmente a realidade. De muitas formas, esse futuro já chegou. Transformações tecnológicas são uma constante e a descentralização da internet por meio da criptografia é a próxima grande revolução digital. Há 15 anos, quando se falava que estaríamos hiperconectados, enviando vídeos de qualquer lugar do mundo e que o celular substituiria os computadores pessoais, muita gente duvidava. O processo de descentralização da internet já está em curso.

Acreditar ou não no impacto dessas transformações está diretamente ligado a resposta a uma pergunta bem simples: o mundo vai se tornar mais ou menos digital nos próximos anos? A resposta parece óbvia.

Passamos grande parte do último ano online e diversas mudanças foram aceleradas. O cenário de pandemia apressou comportamentos esperados para se manifestar daqui cinco anos ou mais. De uma hora para outra o trabalho remoto, comunicação assíncrona, compras online, convivência digital tornaram-se uma realidade que chegou para ficar. Se quase todas nossas interações acontecerem online, fará cada vez mais sentido gastar dinheiro em bens virtuais.

O próximo passo para viabilizar essa transformação é a descentralização da internet. O surgimento das Organizações Autônomas Descentralizadas (DAO, Decentralized Autonomous Organization), com regras especificadas por contratos inteligentes executados e validados no Blockchain, criará entidades auto-governadas. O primeiro exemplo bem sucedido foi o Bitcoin, agora surgiram os NFTs (tokens não fungíveis, non fungible tokens), mas tudo isso é apenas a ponta visível de um processo muito mais amplo.

Por isso, ainda que os criptoativos como o NFT possam estar inflados pelo hype, não se trata de uma bolha, ao menos no sentido clássico. Estamos assistindo à estrutura central dessa mudança sendo montada e começando a ser utilizada (ou notada) por pessoas além da comunidade de usuários pioneiros.

Fases da web

A internet nasceu descentralizada e foi construída sobre protocolos abertos, como HTTP, SMTP, SMS, FTP E IRC para sites, e-mail, mensagens, transferências de arquivos e bate papo. Qualquer pessoa podia construir aplicações e um site, por exemplo, podia ser diretamente acessado por um usuário, sem intermediários.

Em meados dos anos 2000 veio a primeira grande mudança da Internet. Conhecida como Web 2.0, essa nova internet possibilitou a construção de interfaces simplificadas e facilitaram o caminho para que qualquer pessoa pudesse ter uma presença online, com o surgimento primeiro de blogs e depois de redes sociais que tornaram incrivelmente fácil publicar qualquer coisa online, sem necessidade de saber uma linha de código sequer.

Para tornar essas interações possíveis e customizar a experiência, era preciso coletar dados dos usuários. Com o passar do tempo, a capacidade de coletar dados cresceu, assim como a possibilidade de capturar valor, até esse aspecto se tornar o foco principal dessas plataformas.

Essa é a internet que temos hoje: plataformizada e centralizada. Apesar dos inegáveis avanços que essa evolução possibilitou (auto publicação, facilidade de agregação, democratização do alcance, pluralidade de vozes, a lista é imensa), as mudanças provocadas pela plataformização nos afastaram da proposta original da internet, descentralizada e livre.

Hoje as plataformas como Facebook, Twitter, Google, Spotify etc, são as verdadeiras donas do conteúdo e, principalmente, das comunidades que criamos. Algoritmos pouco transparentes decidem o que reverbera mais ou menos. Através de termos de uso igualmente opacos, as plataformas decidem quem pode ou não utilizá-las. E se por algum motivo decidirem encerrar seu perfil, você não pode levar seu conteúdo, muito menos seus seguidores para outro lugar.

Web3: descentralização

A próxima era da Internet já começou com a promessa de corrigir e aperfeiçoar alguns desses aspectos. A Web3 está sendo construída sobre redes criptoeconômicas, como Bitcoin e Ethereum. Combinando as melhores características das duas primeiras eras da Internet, a Web3 será formada por redes descentralizadas e governadas pela própria comunidade, com uma capacidade de gerir recursos maiores do que os serviços centralizados de agora. Junto com essas melhoras, por serem redes criptografadas e sem um responsável único, também veremos novas questões e desafios se apresentarem.

A ideia central da Web3 gira ao redor do consenso, com o aspecto financeiro embutido. Sai o conceito de um órgão centralizador para validar as ações (por exemplo, uma rede social que determina o que pode ou não ser publicado) e entra um mecanismo de consenso e validação distribuído em milhões de nós de uma rede.

Outro aspecto crucial é a interoperabilidade. O protocolo descentralizado SMTP da internet original permite que se envie um e-mail de um provedor para outro (de um Gmail para um Hotmail) sem atrito. Já na Web 2.0, centralizada, não é possível enviar uma mensagem do Twitter diretamente para o Facebook. As redes descentralizadas da web3 permitirão a interoperabilidade entre praticamente tudo, revolucionando todas as indústrias.

A tecnologia que permite isso é chamada blockchain, que nada mais é do que uma lista de registros (os blocos, block), ligados uns aos outros de forma criptografada, listados numa espécie de livro-razão digital (a corrente, chain). Como esses registros são sequenciais e validados através do consenso entre diferentes nós da rede, eles não podem ser modificados retroativamente.

Esse protocolo é a base do Bitcoin, a criptomoeda pioneira que inaugurou e popularizou esse conceito. As chamadas finanças descentralizadas (DeFi, decentralized finance) querem construir um novo sistema financeiro, sem instituições centrais, onde será possível construir aplicações complementarem uma sobre as outras, como Legos de dinheiro.

O discurso da descentralização soa anárquico e anticapitalista, porém ao eliminar os atravessadores e intermediários, a busca é por agregar valor através de uma conexão direta entre fornecedores e consumidores, um capitalismo radical. Não é sobre tirar dinheiro do sistema, mas sim de mudar o sistema, transferindo o dinheiro para quem cria e quem consome e para quem trabalha para manter e aperfeiçoar essa rede

A importância da portabilidade

Na Web 2.0 vivemos numa economia de aluguel. Os ativos digitais que produzimos e utilizamos todos os dias, sejam textos, fotos e vídeos que publicamos, músicas e vídeos que consumimos ou roupas e objetos que adquirimos em games, não nos pertencem, mesmo que tenhamos pago por eles.

Na Web3, os dados ficarão atrelados diretamente às pessoas, a mesma coisa acontece com valores financeiros. O usuário pode levá-los para onde quiser, tendo controle total sobre eles. É a portabilidade. Cria-se uma identidade digital soberana, permitindo a interoperabilidade, com todos os dados e dinheiro embutidos diretamente nos protocolos da Web3.

A partir da hora que tudo que você publicar na internet for registrado no blockchain de forma nativa, em formato de NFT, o autor passará a ter controle total sobre sua criação. Em vez de publicar um arquivo no servidor de uma rede social, por exemplo, ao criar um post você estará apenas apontando para o arquivo em si, hospedado na blockchain e atrelado a sua identidade digital. Nesse formato, os próximos (ou a evolução do) Instagram, Twitter ou Youtube servirão apenas como uma vitrine para exibir as criações dos usuários.

Além de ter sua autoria sempre atrelada a obra, o usuário também terá o poder de autorizar qualquer uso dela. Essa mecânica vai tornar muito difícil para alguém publicar algo sem autorização (da mesma forma que alguém não pode simplesmente imprimir pôsteres de um artista como Banksy para vender sem ter os direitos autorais para isso).

Hoje, os arquivos propriamente ditos não ficam gravados na blockchain, apenas o código referente a ele, apontando para onde encontrá-lo. Para essa transformação de fato acontecer, os arquivos precisarão estar gravados direto na blockchain,

A Web3 nos leva em direção a propriedade de fato. Não apenas você poderá levar esses ativos para outras partes da rede com você, como também poderá vendê-los. É uma vantagem econômica real da Web3 sobre a Web 2.0.

Para replicar as transações e propriedades do mundo físico, a Web3 precisa de uma forma de comprovar a propriedade, origem e escassez desses ativos digitais únicos. Nessa evolução descentralizada da internet, os NFTs fazem a ponte entre a Web3 e a economia virtual do Metaverso.

O que vemos agora com a ascensão dos NFTs é um caso de estudo prático, um pontapé inicial que popularizará os conceitos da Web3.

Tokens não fungíveis e chaves digitais

Non Fungible Token, mais conhecidos pela sigla NFT, são ativos não fungíveis. Fungível é tudo aquilo que pode ser substituído por outro igual, sem perda de valor. Um quilo de feijão pode ser trocado por outro quilo de feijão, uma nota de 10 reais tem o mesmo valor que outra nota de 10 reais, duas moedas de Bitcoin têm valor igual.

Ativos não fungíveis, por sua vez, são insubstituíveis ou não podem ser trocados de maneira direta. Não é possível trocar um quadro do Picasso por um do Da Vinci pois, mesmo que ambos sejam valiosos, seus valores não têm uma relação direta. Nem mesmo dois quadros do mesmo artista têm necessariamente o mesmo valor.

Os NFTs são códigos gravados no blockchain atrelados a ativos digitais que comprovam sua origem, autenticidade e escassez. Através deles, criadores podem assegurar a propriedade sobre suas obras, mesmo que sejam digitais e sem limitar sua divulgação livre na internet. A maior parte dos NFTs estão no blockchain Ethereum, que além de uma criptomoeda própria, o Ether, também oferece os chamados contratos inteligentes, acordos eletrônicos auto executáveis que hospedam o NFT e todas as regras sobre seu uso.

Todos nós somos criadores digitais, todo dia publicamos em diferentes formatos e em diferentes redes, mas quase nenhum de nós tem controle ou mesmo propriedade dessas criações. Toda vez que publicamos algo, transferimos uma cópia do nosso dispositivo para os servidores dessas redes sociais. De acordo com os termos de serviço de várias dessas plataformas, ao fazer isso, compartilhamos também a propriedade desses arquivos.

Os modelos de monetização atuais quase nunca estão alinhados com os interesses dos criadores. As plataformas colhem a maior parte do valor desses conteúdos. O NFT permite que esses arquivos digitais sejam verificáveis e que os criadores detenham propriedade sobre eles. Inverte completamente o jogo.

As aplicações transbordam para o mundo físico. A Nike, por exemplo, patenteou um sistema para atrelar NFTs aos seus tênis, de maneira individual. O chamado CryptoKicks protegerá o consumidor de falsificações, pois apenas os originais terão o código verificável no blockchain.

Valor percebido

A descentralização, portabilidade e propriedade possibilitadas pela Web3 potencializa toda cadeia de valor. Porém, uma das perguntas mais recorrentes é: qual valor de algo digital e facilmente replicável? A resposta é bem simples. É o mesmo valor de ter uma obra original em vez de uma cópia, seja de um quadro ou de um tênis. Seja a coleção de monstrinhos do Pokemon Go, seja roupas e armas do Fortnite, esses bens digitais carregam também um valor percebido e emocional.

Os Pokémon caçados no jogo existem apenas em formato digital, mas nem por isso são menos valiosos para seus colecionadores. Cada coleção é única e, apesar de gratuitos, existe valor social em exibir seus Pokémon para outros jogadores. O mesmo vale para os acessórios comprados no Fortnite ou até mesmo para um comentário deixado num post no Instagram (algo fácil de forjar e que só tem valor se for possível comprovar que o autor é de fato quem diz ser.). O conceito por trás do valor percebido dos NFTs, portanto, já está bem difundido através de nossas diferentes interações online.

No caso das obras de arte digitais, a questão da cópia é ainda menos importante. Quanto mais circula livremente online, quanto mais é compartilhada e vista, maior é o valor cultural dessa obra, tornando a original, canônica, verificável pelo NFT, ainda mais valiosa. A Mona Lisa ou as Marylin Monroe do Warhol originais não são menos valiosas por estarem replicadas em posters, canecas, mousepads ou capas de cadernos. Muito pelo contrário.

Para os artistas, ainda existe a vantagem de por meio dos contratos inteligentes continuarem eternamente ligados às suas obras, podendo receber uma porcentagem das revendas futuras, de maneira automática. É o oposto do que acontece com as criações digitais na Web 2.0, onde uma criação rapidamente perde a ligação com seu criador, perdendo junto sua autoralidade. Para os colecionadores, os NFTs abrem a oportunidade de lucrar com a valorização de suas aquisições dos artistas que decidirem apoiar.

Uma moeda social

No meio da música é muito comum um fã se vangloriar de conhecer determinado artista desde o início de sua carreira, antes de todo mundo. Acontece que por ser muito difícil comprovar esse fato, na prática isso significa muito pouco. No fim das contas, na maior parte das vezes esse fã assiste ao show no mesmo espaço que outro que pode estar conhecendo o artista naquele momento. Isso pode ser diferente se o fã inicial for recompensado pelo artista. Por seu apoio inicial, esse fã pode receber um token fungível que funciona como uma moeda social deste artista. Vamos chamar esse token de $ARTISTA e supor que sejam emitidos apenas 100 unidades.

O token $ARTISTA pode ser oferecido aos fãs de graça, pode ser vendido ou conquistado através de tarefas, como ajudar na divulgação e promoção do artista, e pode dar acesso a experiências exclusivas. Pense em compras prioritárias de ingressos, uma área especial no show, acesso ao camarim, conteúdo exclusivo ou uma interação anual online com a artista.

Agora, imagine se esse artista em início de carreira se transformasse numa Beyoncé, Billie Eilish ou Taylor Swift. Quanto valeria esse $ARTISTA após a fama que alcançaram, tanto em valor sentimental, quanto financeiro? Tanto o artista, quanto os fãs, podem lucrar com a valorização desse token.

Por terem origem, autenticidade e escassez comprováveis, NFTs ou outros tipos de token gravados no blockchain podem servir como chave de acesso para uma infinidade de opções que podem ser exploradas pelo artista ou outros desenvolvedores em diferentes ambientes digitais. As possibilidades são infinitas.

Aplicações no metaverso

Metaversos são mundos virtuais que replicam o mundo físico através de dispositivos digitais. Esses espaços geram experiências coletivas e podem utilizar diferentes camadas, como a realidade virtual e realidade aumentada, servindo como espaços de convívio e de trocas. O formato de metaverso mais popular hoje são os videogames, mas também vivenciamos isso nos encontros no Zoom, nos papos no Clubhouse ou nas compras na Amazon. A Web3 e os NFTs podem conectar esses diferentes mundos.

Na Web 2.0 os metaversos seguem a lógica comercial do aluguel das propriedades digitais. Como não existe portabilidade, o que você compra num metaverso não pode ser retirado de lá. Você não pode comprar uma roupa no Fortnite e vestir seu avatar no Animal Crossing com ela.

Na realidade, sem identidade digital soberana e interoperabilidade, não podemos ser nem a mesma pessoa nesses diferentes ambientes, sendo necessário criar diferentes perfis em cada um deles. Terminamos com múltiplas personalidades, num esquema esquizofrênico. Uma das vantagens da Web3 é equacionar tudo isso. As vantagens econômicas da Internet descentralizada e criptografada terão um papel importante na evolução dos metaversos. Os desenvolvedores poderão construir sobre estruturas sem permissão, numa economia com direito de propriedade muito mais parecida com a do mundo físico.

Com mais contexto para utilização dos NFTs, haverá mais incentivo para os criadores produzirem e para os colecionadores flexibilizarem os direitos sobre suas propriedades. Os usuários terão um leque de experiências mais ricas e também vão querer aumentar a quantidade dos itens que possuem. Isso tudo considerando que a maior parte da nossa experiência ainda é mediada por telas de formatos muito limitados, retângulos sobre a mesa, pendurados na parede ou na palma da mão. Já temos experiências interativas com gadgets de áudio, porém com o avanço do 5G e da Internet das Coisas, muitas outras possibilidades vão se abrir. Questões como “por que comprar uma arte digital se não posso pendurar na minha parede?” não farão sentido algum quando surgirem novos suportes e ambientes para esses bens digitais.

Um dos maiores obstáculos para a realização desse cenário é um metaverso fechado, controlado por uma ou mais grandes empresas, sem interoperabilidade, tornar-se dominante. Pense no Facebook e seu Oculus como vencedor e imagine um metaverso operado com a mesma lógica do império de Mark Zuckerberg. Por isso há uma torcida para que o metaverso aberto na Web3 saia vencedor, obrigando as big tech a se adequar a essa realidade, não o contrário.

O futuro digital

Os NFTs estão demonstrando que existe um mercado para itens digitais, sem valores mediados por uma plataforma central e que possam ser exibidos em qualquer espaço virtual que se escolha. Há estudos que mostram que jogadores gastariam 63% mais em ativos digitais se eles tivessem valor no mundo físico.

Se jogadores já gastam, e muito, em ativos digitais que perdem quando param de jogar aquele game, dá pra imaginar o aumento desse consumo quando esses itens tiverem valor de revenda. Deixa de ser gasto e se transforma em investimento. Os NFTs podem ser a primeira criptografia desvinculada do sucesso do Bitcoin. Eles têm potencial de seguir como realidade mesmo que o Bitcoin perca todo seu valor e podem influenciar todos os softwares.

Essa, porém, ainda não é a realidade da Web3. As interfaces ainda são complicadas, pouco amigáveis para o usuário médio. Em breve, termos como blockchain ou NFT serão absorvidos e serão compreendidos de maneira direta. Ninguém precisa explicar os detalhes de funcionamento quando fala em e-mail hoje em dia. Mas lá no início, era necessário explicar.

Os processos serão internalizados, ficarão invisíveis, serão parte integrante da rede que nos conecta. Será tudo igual, mas completamente diferente. O futuro da internet está chegando. De novo.


Bruno Natal é apresentador do podcast RESUMIDO e sócio-fundador da Colectah, plataforma de NFTs com lançamento previsto para maio de 2021.

quinta-feira

4

março 2021

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Diálogo num balcão

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Essa imagem viralizou como argumento contra o fechamento, mas acabou tendo o efeito contrário, exarcebando o abismo social no Brasil.

Final de tarde, março de 2021, num estabelecimento da zona sul carioca:

   – Obrigado! Se cuida que a coisa vai arrochar.

   – Palhaçada…

   – Como assim? A situação é grave.

   – Vai fechar só aqui… e aí? Nas comunidades não fecha nada, do que adianta?

Ele tem um bom ponto. Os fechamentos funcionam apenas no asfalto, têm impacto, mas podem também dar uma falsa sensação de solução definitiva.

Sigo:

   –  Já está faltando hospital.

   – Tem dezenas de funcionários aqui. Como o patrão vai pagar se não abrir?

   – Isso é uma questão de governo. Não há um plano, estamos completamente a deriva. Está longe do ideal, mas se deixar correr solto morrem milhões e a pandemia não acaba.

   – Isso é o PT querendo derrubar o Bolsonaro. Porque ele não rouba e não deixa roubar!

   – Como assim? O filho do cara tá enrolado até o último fio de cabelo… Você não está vendo?

   – O Bolsonaro é foda! Isso é coisa do CV e da ADA, junto com PT, querendo derrubar o cara.

Quem é contra o fechamento tem uma perspectiva pessoal que justifica sua posição. Muitos por absoluta necessidade. Outros porque só se preocupam com o próprio umbigo. Em todo caso, será uma longa estrada até um difícil 2022.